A
hecceidade é um modo de individuação muito diverso daquele de uma
pessoa, um sujeito, uma coisa ou uma substância. Tudo nela é relação de
movimento e de repouso entre moléculas e partículas, poder de afetar e
de ser afetado. Mesmo quando os tempos são iguais, a individuação de uma vida
não é a mesma que a individuação do sujeito que a suporta. Não se trata
do mesmo plano: plano de consistência ou de composição das hecceidades,
que só conhece velocidades e afetos, e o plano inteiramente outro das
formas, das substâncias e dos sujeitos. Não é o mesmo tempo, também: Aion
estóico, tempo indefinido do acontecimento, linha flutuante que só
conhece velocidades e, ao mesmo tempo, não pára de dividir o que
acontece num já-aí e um ainda-não-aí, um tarde-demais e um cedo-demais
simultâneos, um algo que ao mesmo tempo vai se passar e acaba de se
passar. Por isso Deleuze perguntava: “que se passou?”
Não
passamos de uma hecceidade: latitudes e longitudes, conjuntos de
velocidades e lentidões entre partículas não formadas, conjunto de
afetos não subjetivados. Tem-se a individuação de um dia, de uma
estação, de um ano, de uma vida, de um vento, de uma neblina, de um
enxame, de uma matilha – independentemente da duração e da regularidade.
Aqui nasce toda a possibilidade micropolítica de um devir, de uma
política do impessoal; como Deleuze referia em seu último texto, homo tantum.
A
hecceidade não é apenas um fundo em que se situariam os sujeitos, mas é
“todo o agenciamento em seu conjunto individuado que é uma hecceidade; é
ele que se define por uma latitude e uma longitude, por velocidades e
afectos, independentemente das formas e dos sujeitos que pertencem tão
somente a outro plano.”, escrevem Deleuze e Guattari.
As
relações, as determinações espaço-temporais não são predicados da
coisa, mas dimensões de mutiplicidades. O plano de consistência só
contém hecceidades segundo linhas que se entrecruzam. Uma hecceidade não
tem começo nem fim, nem origem nem destinação; está sempre no meio. Não
é feita de pontos, mas apenas de linhas. Ela é rizoma - intermezzo.
- Tirado de um blog de Doidões
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